As pessoas físicas andam interessadas em sustentabilidade, ou ESG (sigla em inglês para a agenda ambiental, social e de governança), mas ainda poucas investem o seu dinheiro com isso na cabeça. É o que aponta um artigo publicado pelo Fórum Econômico Mundial recentemente. As principais barreiras de entrada aos pequenos investidores nesse agito do bem são a falta de simplicidade e de padronização da indústria, conforme os autores.
“Não há nada de simples em investimentos sustentáveis hoje, com o setor marcado pela complexidade, confusão de terminologia e falta de padronização em termos de práticas”, escrevem Simon Smiles e Rodrigo Tavares.
Na avaliação deles, se os investimentos fossem mais simples e padronizados, atendendo aos interesses dos investidores de varejo, mais dinheiro entraria no mercado e as companhias seriam ainda mais incentivadas a melhorar.
“Isso seria uma melhoria significativa em relação à situação típica de hoje, com a maioria das empresas ignorando as melhorias ESG em seus negócios principais do dia-a-dia devido à falta de participação real do investidor de varejo em investimentos sustentáveis”, afirmam.
No Brasil, o volume de dinheiro investido em produtos que seguem uma estratégia ESG não está subindo proporcionalmente nem em comparação ao crescimento galopante do número de novos investidores na bolsa, nem em relação ao aumento da produção de conteúdo sobre o assunto, afirma ao Valor Investe Rodrigo Tavares, co-autor do artigo, fundador e presidente do Granito Group, dedicado à economia de impacto, e professor de finanças sustentáveis na Nova School of Business and Economics, em Portugal.
Uma das razões que salta à vista dele é que ainda existe um desentendimento sobre o que são produtos ESG. “Ainda há muita gente que acha que investimentos ESG são exclusivamente aqueles que têm a intenção de gerar impactos positivos, em educação, saúde e energias renováveis, por exemplo. Com isso, infelizmente ainda brotam os receios de que os lucros podem ser comprometidos. Mas ESG não é só um produto. É sobretudo um método de investimentos”, diz.
Tavares explica que aplicar esse método significa integrar dados, políticas e práticas ESG nas decisões e, no frigir dos ovos, ser um bom investidor. “Mas nem os investidores individuais conhecem essas particularidades, nem os gestores dos produtos têm as ferramentas para comunicar o perfil ESG do ativo de forma simplificada”, afirma.
No futuro, o professor acha que a incorporação desse tipo de prática será tão banalizada que não fará sentido para um investidor individual conhecer os detalhes de como ESG é incorporado. Bastará saber que é bem incorporado, e para isso, será suficiente saber que o produto tem algum tipo de certificado ESG.
Ainda está distante do que acontece hoje. Um estudo da consultoria e auditoria PwC Brasil e do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon) apontou que os relatórios das companhias do Ibovespa ainda estão longe do ideal: 51% não citam a origem dos produtos, 49% não esclarecem sobre a gestão de resíduos e 45% não expõem sobre diversidade e inclusão. Vale lembrar que as empresas do Ibovespa são o “crème de la crème” da bolsa brasileira. Portanto, pode-se imaginar como esses percentuais devem ser ainda menores no restante da bolsa.
O levantamento ainda mostra que 43% dos relatórios de sustentabilidade não passam por asseguração de uma auditoria independente e que 31% não divulgam compromissos mensuráveis com relação a temas sustentáveis. Isso tudo ainda considerando apenas as empresas do Ibovespa.
Maurício Colombari, sócio da PwC Brasil, afirma que até os gestores de fundos de investimentos que compram ações precisam se sofisticar para transitar nesse assunto. “Está todo mundo acostumado a analisar balanço financeiro. Compreender o que os pilares ambiental, social e governança significam tem uma complexidade enorme”, diz.
“Não me surpreende ser difícil para a pessoa física. Neste momento, acho que é esperar um pouco demais. É mais realista que a pessoa física pense em investir em fundos sustentáveis.” Ele concorda que dados mais padronizados são bem-vindos até para facilitar a vida dos gestores profissionais e, consequentemente, dos pequenos investidores. “Os relatórios de sustentabilidade pecam pelo excesso”, afirma.
Engajada na discussão sobre investimentos ESG, a gestora brasileira JGP está desenvolvendo uma plataforma para disponibilizar dados sustentáveis divulgados pelas companhias da bolsa de forma organizada. Além de apresentar as informações de uma forma comparável, a ideia da casa é dar uma nota de sustentabilidade para cada empresa, considerando que o ambiental, o social e a governança têm pesos diferentes conforme a companhia.
Em julho do ano passado, a casa divulgou uma carta considerada uma espécie de manual para quem quer trilhar o caminho do investimento sustentável no Brasil. A gestora integrou o ESG no processo de investimento de todos os fundos. “É uma ferramenta extraordinária para mitigar riscos e achar novas oportunidades de investimentos atreladas às mudanças pelas quais o mundo vem passando”, complementa Guilherme Bragança, sócio e um dos responsáveis pela área de relações com investidores da JGP.
Contudo, fazer isso acontecer exige muito tempo de estudo e o processo pode ser difícil para a pessoa física. “ESG ficou na moda e muita gente começou a falar disso de uma hora para a outra”, afirma Tullio. “Mas o trabalho de escolher uma empresa para investir, que já era difícil, ficou ainda maior.”